João Anatalino

A Procura da Melhor Resposta

Textos


Os  procuradores do Ministério Público do Trabalho não gostaram nada da reforma trabalhista aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente Temer na semana passada. Para eles, a reforma só beneficia os maus empregadores.
Não concordamos com eles, mas numa coisa eles tem razão. Faltou mais debate, mais envolvimento das partes interessadas, que são os próprios trabalhadores e os empregadores, faltou mais opinião técnica. O processo ocorreu em um clima de confrontação política, onde uma facção assumiu a aprovação como ponto de honra e a facção contrária a sua derrocada a qualquer custo. Em um clima desses, em que o embate político vira uma guerra de trincheiras, vale mais impor uma derrota ao adversário do que a conquista de qualquer outro objetivo mais importante para a causa pela qual todas as guerras – pelo menos em tese– são travadas: o bem estar do povo e da pátria.
A verdade é que no Brasil tudo se faz com açodamento e frivolidade. Parecemos o sujeito da piada, que encontrou a mulher transando com um cara no sofá da sala e a única providência que tomou foi a troca do sofá.
Reformas estruturais são perigosas e dão trabalho. Por isso, quando a casa está caindo, colocam-se algumas vigas novas para sustentá-la e dá-se uma mão de tinta para maquiar.   Exemplo desses disfarces são as nossas diversas Constituições. Cada vez que o país entra em uma crise política a primeira coisa que se faz é mudar a Constituição. Revoga-se a anterior e faz-se uma nova. Em menos de 200 anos, tivemos nove Constituições. Mas pouca coisa mudou no essencial. 

A legislação trabalhista é outro caso típico que mostra bem a natural tendência que nós temos em evitar mudanças signifiativas de estrutura. Até 1937 não tínhamos uma legislação específica que tratasse das relações entre trabalho e capital. Até porque, nessa época o país ainda estava apegado ás suas velhas tradições coloniais, e mal tinha evoluído de uma estrutura escravagista para um modelo semelhante á velha Rússia dos tzares, com seus “brancos” (fazendeiros e industriais, defensores do regime imperial) e mujiques e proletários ((trabalhadores rurais e urbanos ). Foi o medo de que uma experiência semelhante á ocorrida na Rússia, com a tomada do poder pelos comunistas, acontecesse no Brasil, que fez Getúlio Vargas optar pelo modelo fascista de organização trabalhista adotada por Mussolini na Itália. Foi uma jogada inteligente do velho caudilho gaúcho, pois ao mesmo tempo em que manteve a estrutura obsoleta do capitalismo que se aplicava no país, aplacou a nascente luta reivindicatória do incipiente movimento trabalhista que então se formava no país.  Não foi, pois, uma decisão avaliada com critério, em um contexto amplo, com a participação dos principais interessados, mas sim uma medida de ocasião, tomada somente como necessidade de um momento político. Vargas deu aos trabalhadores brasileiros um sindicato atrelado ao Estado, que desde então ficou conhecido como sindicalismo “pelego”.  E para garantir isso criou o imposto sindical, mecanismo que ao mesmo tempo em que permitia que os sindicatos sobrevivessem, os atrelava ao Estado, fazendo com que suas existências dele dependesse. E essa relação promíscua dura até hoje. 
A legislação trabalhista de Vargas, como é óbvio, precisou criar um enorme aparato estatal para garantir a sua aplicação. Poucos países no mundo têm uma máquina burocrática tão grande e custosa como a nossa para regular relações que deveriam ser resolvidas entre as partes e só incidentalmente submetidas ao crivo do poder judiciário. Hoje, o conflituoso campo das relações trabalhistas é o território mais propicio para aventuras jurídicas de causídicos sem ética que entopem os tribunais com ações sem mérito, buscando uma composição que eles sabem, o empregador procurará fazer, pois o custo de manutenção do litígio sempre lhes será desfavorável.
Nesse sentido é possível entender que os integrantes do Ministério Público do Trabalho estejam preocupados com a reforma trabalhista em andamento. Afinal de contas eles fazem parte e vivem dessa engrenagem e qualquer enxugamento que se faça nela pode trazer uma diminuição no seu campo de atuação. Numa situação dessas o corporativismo sempre fala mais alto.
Porém, as reformas trabalhista, previdenciária, e  principalmente a política, são imprescindíveis, para que o páis possa, de fato, se libertar desse velho  ranço feudal que ainda domina a estrutura do Estado brasileiro. Mas isso não pode ser feito ao sabor das paixões políticas momentâneas e oportunistas, como têm sido feito até agora. O ideal é isso fosse discutido ao longo de um processo em que as verdadeiras necessidades do país fosse o foco e as paixões partidárias e os interesses corporativistas não estivessem estivessem guiando o debate. Do modo que está sendo feito a única coisa que vai ser de fato trocada, novamente é o sofá.  
 
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 17/07/2017
Alterado em 17/07/2017


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